Por Ulisses Reis
Passado o ritmo frenético do noticiário nacional e local sobre os resultados das eleições de 2024, alguns outros nuances do recente processo democrático-eleitoral merecem vir à tona. Um dos mais emblemáticos diz respeito à judicialização da competição política, assunto que desperta curiosidade nos mais diversos matizes da sociedade, pelo que passou a ser apelidado de “terceiro turno” eleitoral.
Resolvemos conferir como se comportaram os atores jurídicos mais proeminentes na competição política (candidatos, partidos e Ministério Público) no estado do Rio Grande do Norte nestas eleições de 2024. Para isso, acessamos os dados processuais estatísticos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e filtramos apenas os processos relacionados ao referido estado. Ao todo, foram registradas 21.197 ações judiciais no banco de dados da Justiça Eleitoral, dos mais variados assuntos e classes (pedidos de registro de candidatura, prestações de contas eleitorais, representações etc.).
O nosso interesse consistiu em identificar a distribuição geográfica destes processos, considerando os 167 municípios do estado. A nossa hipótese é a de que existe certa concentração da judicialização em municípios que apresentam indicadores sociais, demográficos e políticos mais elevados, como, dentre outros, população, renda e número de cadeiras disponíveis nas câmaras municipais. A distribuição cartográfica pode ser vista no mapa abaixo.
Embora esta postagem não tenha a pretensão de adentrar em testes estatísticos para comprovar a nossa hipótese, o mapa do Rio Grande do Norte nos dá alguma segurança em dizer que a percepção preliminar parece correta. A título de exemplo, apenas os três maiores municípios do estado, Natal (1.295), Parnamirim (784) e Mossoró (722), são responsáveis juntos por 2.801 ações judiciais, alcançando 13,2% dos casos. Se aumentarmos o alcance para os dez primeiros municípios, englobando São Gonçalo do Amarante (558), Tibau (374), Ceará-Mirim (359), Nísia Floresta (331), Extremoz (313), Currais Novos (300) e Macaíba (298), estas localidades correspondem a 25,2% da distribuição.
Ou seja, apenas dez municípios, de um universo de 167, são responsáveis por um quarto da judicialização do Rio Grande do Norte nas eleições recentes. É provável que, com uma exceção ou outra, estas sejam as localidades que mais tiveram cadeiras em disputa nas câmaras municipais, o que atrai mais candidatos e judicialização, além de serem as cidades mais populosas, com maior renda e maior dinamismo econômico. Estes fatores podem ser explorados em pesquisa acadêmica para a possível validação da hipótese aqui desenvolvida.
Compreender os elementos que fomentam o nível de judicialização das eleições é essencial para candidatos, partidos e para a Justiça Eleitoral. Antecipar os dilemas trazidos ao Judiciário é fundamental para quem traça estratégias políticas, administrativas e jurisdicionais sobre a operacionalização das eleições.
Ulisses Reis é pesquisador e professor de Direito na Ufersa.