Por Alexandre Fonseca
Peço licença aos leitores da ‘Coluna Dilemas’, para um momento único e pessoal, na vida deste ser humano que vos escreve. Os próximos cinco parágrafos serão destinados a minha genitora, que concluiu sua jornada na terra, no dia 8 de dezembro de 2023, Dia de Nossa Senhora da Conceição, na Casa de Saúde Santa Luzia.
Mãe,
Não me conformo com o tempo passando tão rápido, aumentando a distância do dia em que a sua ausência física foi concretizada. Estava tão esperançoso quando, naquela sala de hospital, observava sua respiração calma, em descanso e falava baixinho, da sua força. Queria a sua recuperação total. Mas isso não aconteceu.
Vivi algumas primeiras experiências sem poder compartilhar fisicamente. Lancei meu primeiro documentário sem a sua presença, sem ter a chance de escutar a sua opinião. Comemorei meu primeiro aniversário, sem receber os seus parabéns, sem o abraço e os cheiros. Passei pelo primeiro 8 de março, apenas recordando o projeto que lançamos lá em 2020.
Depois de tudo, a rotina precisou ser reestruturada. Ainda passa por inúmeras adaptações. A mente está processando, no entanto, em um bom estágio de entendimento. Recebi alta esses dias do psicólogo. Tenho feito muitas ações com o objetivo de deixá-la bem ocupada. Ainda assim, inevitavelmente, penso em como imensuráveis episódios seriam, com a senhora aqui. Está chegando a época junina, da qual temos lembranças recentes, e cada vez que pisar naquele ambiente, vou emendar as memórias que construímos.
Esses dias um sonho meu, trouxe um afago tão bom. Sua imagem em casa, com seu fone de ouvido, escutando talvez suas músicas coreanas, gosto recente que havia adquirido meses atrás. Parecia real, que nada tinha acontecido e que a vida seguia sem atribulações. Daí, eu acordei. Ah, tive acesso a uma obra sobre Santa Luzia, que me fez entender sua partida ser na Casa de Saúde da Santa, padroeira de Mossoró.
Sinto falta de fazer suas tapiocas, das ligações me chamando para almoçar, de achar ruim quando me destinava a resolução de problemas, de viajar para o sítio, de assistir aos filmes de ação pela 20ª vez, pelos simples fato da gente gostar muito (fizemos isso em alguns domingos de 2023), de te ver dançar sem se importar com o que estivesse ao redor. São três meses sem suas perspectivas, sem suas advertências, sem seus novos ensinamentos, sem sua luminescência. Fiquei aqui, ouvindo os áudios das conversas que permanecem salvas. Fiquei aqui, lembrando da senhora, o tempo todo. Sinto sua falta, mãe. Te amo!
Pondere e não pondere.
As metáforas e/ou frases feitas sobre o tempo, são reais e dolorosas. A gente sabe e tem conhecimento de vida, de que nada é pra sempre, porém, não estamos prontos para algumas obrigatórias, arrebatadoras, cruéis e angustiantes mudanças.
Tinha muita coisa planejada com um único objetivo de criar incontáveis memórias, com a minha família, de uma maneira singular e aconchegante. Não deu! Se tornou um dos maiores dilemas de toda a minha vida.
Pondere de verdade, as escolhas que podem ser feitas, visando o aproveitamento do que é realmente importante. Sou grato pelo que vivi com minha mãe por trinta anos, dos quais, me lembro com clareza, de mais de vinte deles. O resto, é história fixada nos registros antigos, feitas com filtro e guardadas em álbuns fotográficos.
Do futuro, tenho plena consciência, de que vou sempre analisar as circunstâncias, como se ela ainda estivesse aqui fisicamente e fosse parte de cada processo meu. Confesso que tenho tido resistência para seguir alguns caminhos, mas, aos poucos, vou resolvendo, aplicando o vigor necessário e projetando o que ela deixou.
Se você leu até aqui, não pondere, decida viver! Ponderar requer tempo de cogitação. E tem realidade que não vai lhe permitir pensar, será alterada o mais rápido do que você possa imaginar e temos que aproveitar a qual existimos. Pondere no sentido de refletir, na mesma medida de não ponderar, no sentido de avaliar demais. Viva!
Alexandre Fonseca é jornalista, cineasta, escritor, produtor cultural.