Matheus Teixeira/Marcelo Rocha – Folha de S.Paulo
Os ministros do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) encaminharam ao STF (Supremo Tribunal Federal) uma notícia-crime para investigar o presidente Jair Bolsonaro e o deputado federal Filipe Barros (PSL-PR) por suspeita de divulgação de dados sigilosos contidos no inquérito da Polícia Federal que apura um ataque hacker sofrido pela corte em 2018.
Todos os integrantes do tribunal eleitoral assinam o pedido. Eles requerem que o chefe do Executivo e o parlamentar sejam investigados no âmbito do inquérito das fake news por “possível conduta criminosa”.
Os magistrados também pedem que seja determinada a exclusão das publicações de Bolsonaro e de Barros sobre o tema.
Bolsonaro fez a publicação após afirmar em programa da rádio Jovem Pan que comprovaria a fraude nas urnas eletrônicas. Um dia depois, a corte eleitoral desmentiu o presidente e disse que o episódio, que ocorreu em 2018, “embora objeto de inquérito sigiloso, não se trata de informação nova”.
Segundo o tribunal, “o acesso indevido, objeto de investigação, não representou qualquer risco à integridade das eleições de 2018. Isso porque o código-fonte dos programas utilizados passa por sucessivas verificações e testes, aptos a identificar qualquer alteração ou manipulação. Nada de anormal ocorreu”.
Na notícia-crime encaminhada nesta segunda, os ministros do TSE também indicam possível irregularidade na conduta do delegado da PF que levantou o sigilo do inquérito.
“Há indícios, portanto, de que informações e dados sigilosos e reservados do TSE tenham sido divulgados, sem justa causa, inicialmente pelo delegado de Polícia Federal, e, na sequência, pelo deputado federal Felipe Barros e pelo presidente da República, Jair Messias Bolsonaro”, afirmam.
Os ministros citam o possível cometimento de dois crimes previstos no Código Penal que, somados, podem chegar a uma pena de 4 anos e seis meses de prisão.
Todos os sete integrantes titulares do TSE assinam a notícia-crime. São eles: o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Edson Fachin, que também são do STF; Luís Felipe Salomão e Mauro Campbell, que também compõem o STJ (Superior Tribunal de Justiça); e Sergio Banhos e Carlos Horbach, originários da advocacia.
Moraes é o relator do inquérito das fake news no Supremo e deve tomar uma decisão sobre a inclusão desse fato na investigação nos próximos dias.
No inquérito em questão, ao contrário do que Bolsonaro disse, o TSE não admite que houve fraudes. A investigação descreve etapas onde se verificou que não houve alteração indevida de sistemas críticos que fazem parte do ecossistema da urna.
Antes mesmo da divulgação por Bolsonaro, a Folha teve acesso ao inquérito citado pelo presidente e consultou especialistas e uma pessoa envolvida na investigação, que foram unânimes: ele não conclui que houve fraude no sistema eleitoral em 2018 ou que poderia ter havido adulteração dos resultados, ao contrário do que disse o mandatário.
O caso da invasão, em módulos que não alteram a votação em si, já tinha sido revelado em reportagem no site Tecmundo em novembro de 2018. A partir disso, foi instaurado ainda naquele ano um inquérito sigiloso pela Polícia Federal.
A reportagem do Tecmundo deixava claro que “os invasores não tiveram acesso ao módulo do sigilo do voto: isso significa que não foi possível acessar a parte do sistema que exibe os votos dos eleitores. Além disso, o código do GEDAI é ‘público’: após a assinatura de um termo de sigilo, partidos, Ministério Público e OAB, por exemplo, podem pedir o acesso”.
A medida do TSE se soma a diversas outras aprovadas pelo tribunal eleitoral contra Bolsonaro.
Primeiramente, a corte eleitoral decidiu, na última segunda-feira (9), por unanimidade, abrir um inquérito para apurar as acusações feitas pelo presidente, sem provas, de que o TSE frauda as eleições.
Depois, Barroso assinou uma queixa-crime contra chefe do Executivo e recebeu o aval do plenário da corte eleitoral para enviá-la ao STF.
Na última quarta-feira (4), o corregedor-geral do TSE, ministro Luís Felipe Salomão, solicitou ao Supremo o compartilhamento de provas dos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos com a ação que pode levar à cassação de Bolsonaro.
No mesmo dia, Moraes aceitou a queixa-crime de Barroso e incluiu Bolsonaro como investigado no inquérito das fake news.